domingo, 11 de setembro de 2011

Estudo usa células-tronco de dentes de leite para reconstruir córnea

 Testes com coelhos sinalizam sucesso em humanos que perderam a visão.

Por enquanto, alguns coelhos são os únicos pacientes privilegiados com o experimento. Mas novos avanços com humanos, em uma pesquisa pioneira no mundo com células-tronco de dentes de leite para reconstrução de córnea, estão sendo alcançados no Instituto Butantan — que completou em janeiro 110 anos — e na Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Os animais receberam aplicações das células dentárias na região límbica e recuperaram a visão. O projeto começou há seis anos nos laboratórios do Butantan, ainda de forma tímida.
O limbo ocular (aqui, a palavra ganha conotação de vida, em vez dos significados bíblicos negativos de algo colocado ‘à margem’, de ‘esquecimento’, de ‘indiferença’) é uma espécie de fonte de renovação de tecidos fundamentais para a córnea produzir a visão. “Mas quando a região límbica é afetada por um trauma ou uma doença, a córnea perde a capacidade de regeneração e se torna opaca, comprometendo a visão”, explica autora do projeto, a biomédica Bábyla Geraldes Monteiro, do Butantan.
“Quando o problema afeta apenas um dos olhos, é possível retirar células límbicas do olho saudável do próprio paciente para transplante”, explica o oftalmologista da Unifesp José Álvaro Pereira Gomes, coautor do estudo. “Mas, quando os dois olhos são afetados, a única opção hoje é recorrer a um doador, e sempre há risco de rejeição. Com as células-tronco de dentes de leite, esse risco é muito menor”, diz Bábyla.
Com a nova tecnologia, não será necessário recorrer a doadores de córnea nem o paciente estará exposto à rejeição do órgão. Além disso, não precisará regular o tratamento com o uso de imunossupressores. “As células-tronco de polpas de dentes de leite possuem alto potencial de diferenciação, semelhantes às embrionárias, e não provocam rejeição”, atesta a biomédica do Butantan. Segundo a pesquisadora, esse tipo de célula não causa rejeição porque não possui em sua membrana as proteínas necessárias para que as células de defesa do organismo iniciem uma resposta imunológica.
“Cobaia” humana
No começo da pesquisa, os coelhos foram submetidos a danos induzidos na órbita ocular com lesões corneanas, mas, em seguida — de duas a três semanas após o experimento —, voltaram a enxergar. Quando sofreram as lesões, eles procuravam ficar em apenas um dos lados das gaiolas, como se buscassem a luz. Em seguida, com o êxito do implante, eles passaram a se locomover aleatoriamente pelo ambiente.

Cobaias
“Depois de várias etapas do projeto, vimos que pessoas que sofreram lesões na região límbica (espaço que fica entre a parte colorida e a parte branca do globo ocular) por traumas, queimaduras térmicas ou químicas, também poderiam ser tratadas com sucesso”, explica Bábyla Monteiro, numa referência ao caso de uma mulher, cujo nome ainda é mantido em sigilo, que se submeteu a uma reconstrução de córnea com células-tronco de dentes de leite.
A paciente está reagindo bem, recuperou a visão parcialmente, mas ainda não se pode falar em resultados clínicos positivos definitivos, ressaltam médicos da Unifesp que fizeram a cirurgia de recuperação da córnea na primeira ‘cobaia’, em setembro do ano passado. “Temos de esperar alguns meses”, avalia Pereira Gomes, que fez a reconstrução de córnea com célula-tronco. “Ela está sendo devidamente acompanhada para sabermos avaliar melhor os resultados do procedimento”, acrescenta.
Embora otimista com os resultados iniciais, o médico comenta que o assunto exige o máximo de cautela para não provocar esperanças vãs em outros pacientes. “O projeto é real, tem tudo para dar certo, mas não sabemos muita coisa, por exemplo, sobre a durabilidade do processo”, pondera. Provavelmente, pensa Bábyla, antes de agosto deste ano os resultados clínicos tão esperados pela equipe do Butantan e da Unifesp serão divulgados. Outros 25 pacientes que foram selecionados em agosto do ano passado já se submeteram ao trabalho de reconstrução de córnea.
Força e tradição
Criado em 1901, o Instituto Butantan é um dos maiores centros de pesquisa biológica e médica do mundo. É responsável por mais de 80% de soros e vacinas para uso profilático e curativo produzidos no Brasil. Somente em 2010, o instituto produziu 160 milhões de doses de soros e vacinas. Dentre elas, as da gripe A, de hepatite B e 13 tipos de soro. O instituto completou 110 anos em 23 de fevereiro, que serão celebrados com a construção de um novo e moderno Prédio de Coleções. O antigo foi destruído em um incêndio em maio de 2010 e abrigava a maior coleção de répteis do mundo.
Fonte: Correio Braziliense

Nenhum comentário:

Postar um comentário